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terça-feira, 9 de julho de 2013

Te Matarei para Sempre



Para Lumyah e Raphael

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Quando a noite vem e o calor se afasta um pouco, quando damos sorte; um vento fresco revolve a cidade. A brisa traz uma falsa sensação de alívio bem sei. Que seja. Preciso disto. Pelo menos isto. Aí a madrugada chega. Então ele acorda. Quando ele acorda, eu me acordo. Na escuridão do nosso quarto ele geme. De tristeza. As lágrimas vêm. Ele chora.

Ele chora e me abraça de noite, a noite inteira. De dia ele sorri. Ele sorri bem. Acho que quem está de fora, o percebe como uma pessoa feliz. Fora de série. Extraordinária.

Eu o amo. Amo intensamente. Irracionalmente. Geneticamente. Está nas minhas células eu sei.
Ele começou a mudar o mundo do seu jeito muito jovem. Muito jovem mesmo. Tinha sete anos. Mudou seu mundo com um copinho de plástico, acredita?

Ele vivia com os pais de favor na mansão de uma tia. Viúva e rica; ela os suportava. Eles em troca cuidavam de seu bem estar na medida do possível. Os pais passavam a maior parte do dia na rua, trabalhando em serviços mal remunerados e medíocres. Um trabalhava fora de manhã. Outro de tarde. O tempo passado na mansão era preenchido por atividades de manutenção. Meu chorão; perdia-se pelos jardins bem cuidados enquanto seus pais levavam uma vida tranqüila de servidão.

Um dia, ele pegou um copinho de plástico e pintou de preto com caneta de retroprojetor. Depois o abriu em copas como se fosse uma flor. Uma flor de oito pernas. Desta flor, fez uma aranha. Uma aranha com oito pétalas. Amarrou um fio transparente neste copinho. Esfregou fezes de gato no fundinho bem pretinho. Quando um dia, a tia descia a escadaria da mansão vitoriana, atirou nela esta aranha. Tamanho foi o susto, que ela despencou escada abaixo. Braços e pernas rolando em movimento. Bateu a perna que quebrou indo parar nas costas. Partiu o braço o baço e a coluna, nas quinas dos degraus; dando cada grito de gelar o sangue nas veias. A última coisa a ficar torcida, foi o pescoço; quando o corpo aterrizou no chão do hall que precede a sala de visitas. 

Tudo isto, com um copinho de plástico apenas.

Depois disto, já dono da mansão isto é, seus pais e por conseqüência ele; foi à vez de um filho do vizinho. Eles encontravam-se nas matas. Gostavam de piqueniques. Faziam-se de aventureiros. Diziam que eram piratas. Mas toda brincadeira cansa e garotos gostam de novidades. Ele brincando na lama do pântano, achou um dia um sapo enorme. Tinha oito anos meu chorão. Como seu amigo estava atrasado para as brincadeiras; decidiu brincar com o sapão.

Havia trazido um lanche numa cesta. Ao exercer seu domínio sobre o batráquio, foi atingido por um jorro de leite que o bicho expeliu pelas costas. Naquele instante, foi tomado por uma idéia genial. Arrastou o animal por uma das patas e amarrou-o em uma árvore. Cutucando-o com uma vara, tirou leite das costas dele pra encher uma garrafa, que guardou na cesta de piquenique. Depois, foi banhar no riacho. Logo o amigo de aventuras chegou. Ele já estava arrumado sem lama no corpo, talvez apenas um pouco atrás da orelhas. O corpo do bicho morto jazia no fundo de um poço.

Reinaram.

Como estava tarde. Brincara bastante. O amigo veio correndo devia estar com fome também. Nada melhor que um bom lanche. Serviu o amigo um sanduíche de pão com queijo e leite misturado com bastante achocolatado. Bastante mesmo. Abraçou o amigo disse adeus e foi embora. Nunca mais o viu. Morreu ao chegar à porta de casa. O amigo morreu. Nos braços da mãe. Garoto de sorte. A causa da morte ninguém nunca soube. Para os mais antigos o cheiro do cadáver; lembrava veneno de leite de sapo.

Aos doze anos meu amor, teve seu primeiro amor. A primeira namorada. Filha de uma empregada que trabalhava na casa. Ele passava o tempo todo lá. Casa sombria fechada. Seus pais não o deixavam mais ir a nenhum lugar. Um dia, estavam a brincar de namorar no quarto da matriarca. Ela usava as maquiagens chiques que o papai dava para mamãe usar. Ela apanhou um comprido lápis de olho novinho em folha. Aproximou-se do espelho para o olho decorar. 
Ele correu sobre a cama King Size, saltando sobre os ombros dela, fingindo querer abraçar. O espelho quebrou quando ela bateu forte a testa nele. Ele a chamou. Mandou ela se levantar, mas ela estava morta. O lápis enfiado bem fundo no cérebro, atravessou crânio e  globo ocular.

O tempo passou como sempre passa e sempre passará. Ele agora só ficava no quarto. Trancado no quarto. Isolado. Seus pais não o deixavam sair por nada. Tinha quinze anos. 

Fugiu uma noite, quando seu pai foi levar-lhe o jantar. Amarrou o cadarço de seus sapatos em uma sandália e laçou o pai para dentro da jaula. Não queria matar. Mas como o pai resistia; usou o cadarço de sapato para o pescoço dele apertar. Rapidamente asfixiado seu velho ficou; ele podia ter parado, mas não parou. Só parou, quando o coração mole papai parou.

Numa folha de papel, escreveu uma carta incriminadora e assinou usando o nome do velho. Era assim:

“Ando com medo de ir para casa. Minha mulher me trata mal. Me olha estranho. Não como nada que venha de suas mãos. Acho que ela me odeia. Tenho medo que me vá matar.”

Baseado nestas evidências e no testemunho do filho que chorava berrava e xingava a mãe, pelo assassinato do pai. A genitora ardeu na cadeira elétrica. Tudo por causa de uma folha de papel. 

Depois disto, passou quieto um bom tempo. Agora senhor do castelo, viajava bem longe para assim poder celebrar. E brincava e brincava. Brincava demais. Amava seus joguinhos. Brincar de matar. Joguinhos fatais.

Arrumou uma companheira. Uma companheira de metal. PT 380. A quadrada. Agora era divertido de verdade. Muito mais do que especial. Montava e desmontava-a com facilidade, sem pestanejar.

Um dia assistiu a um filme violento num cinema perdido em vasta cidade decadente. Decidiu tentar fazer o que assistiu no filme. 

Foi para o banheiro, desmontou a quadrada. Ia matar usando pistola 380 sem bala. Pegou a parte de cima do cano, a que se move; bloco de trancamento e segurou firme na mão, enquanto escondia-se no banheiro feminino imundo. Quando uma postretuta inocente entrou naquela pocilga para lavar a boca, ele a atacou com o bloco que possuía uma extremidade pontuda. Golpeou o pescoço o rosto e a cabeça dela com aquela ponta. A mulher de vida fácil era difícil. Uma batalhadora e deu um certo trabalho, mas perdeu muito sangue e acabou com a cabeça enfiada no fundo do vaso sanitário.

A vida era boa. Ele subiu no avião e de passaporte na mão; foi matar em outro lugar.

Um dia ele me conheceu. A única pessoa que mata mais que ele sou eu. Este é o meu esporte. Quero bater um recorde. Meu recorde. Ele não pode me vencer. Então não deixo ele matar. Dele tudo tomei. Para ele não fugir, suas mão e seus pés amputei. Sua língua eu cortei para ele não pode gritar. Passo os dias pelas ruas e ele com uma babá. E de noite ele chora e chora. O porquê não sei bem; deve ser por não mais poder matar.

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