Apresentação
Quando amanhecer e você encontrar a colina rochosa em contraste com o
céu em chamas, ajoelhe-se encostando apenas um dos joelhos no chão.
Abaixe a cabeça. Faça um minuto de silêncio. Lembre-se dos que lutaram e
morreram nas guerras. Se cada um deles sem exceção não tivesse feito o
que fez, você não estaria aquí.
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Introdução
Existe. Ela existe até hoje. É uma colina ancestral entre Bulgária,
Grécia e Albânia. Não, não há nada demais nela. Nada que salte aos olhos
dos passantes. Para a maioria das pessoas, é quando muito, apenas uma
corcunda sólida de magmático Granito, extrusivo Basalto e metamórfico
Mármore de médio porte; unida por terra argilosa que de tanto ser
pisada, socada e cozida pelo sol ao longo dos milênios; tornou-se também
dura como pedra. Não há nenhum tipo de vida vegetal que lá consiga
fincar raízes ou absorver água. Mas a verdade, é que aquela colina é
muito especial. Possui uma história. Uma não! Milhares. Milhares,
imagina?! Vou lhes contar apenas uma e não será longa. Algo que
aconteceu comigo que nasci aos pés desta massa, e agora curto velhice
depois de ter corrido o mundo inteiro; em um pitoresco vilarejo a apenas
uma hora de carro deste monumento, a todos os guerreiros que viveram no
passado, e aos que ainda virão futuro afora. Claro, que se você pensa
de outra forma, posso desdizer o que disse, e afirmar diferente. Digo
então; que nesta colina nunca houve passado ou futuro. Apenas presente.
Um combate contínuo, que estende-se desde o início de sua existência
através do tempo. De outra forma, também posso livre e tranquilamente
afirmar; que é apenas passado. Um passado repetitivo de lutas; a jorrar
indefinidamente futuro a dentro. Séculos, para que servem séculos? Eras?
Para ela, não são nada.
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Você sabe o que é um algoz? Sabe mesmo? Acho que não. Acho que você não
sabe. Isto nem é culpa sua. Poucos sabem. Ser ignorante sobre algozes é
uma bênção. Você deve ficar orgulhoso de ser tolo. Mantenha-se assim até
quando puder. Até quando a vida deixar. Agüente o máximo. Este é meu
conselho. Claro que quando tua hora chegar, e creia, inevitavelmente ela
um dia chega mesmo, para todo mundo; você não saberá se defender e
morrerá de imediato. Como os carneiros e ovelhas. Mas isto não me
importa. Eu não me importo com sua vida. Tenho algo mais importante para
fazer. Contar a minha história.
Uma linha fronteiriça de quatrocentos e setenta e seis quilômetros corta
mundos. Ao sul da Bulgária e o nordeste da Grécia temos a tríplice
fronteira Bulgo-Greco-Macedônica. Mais a leste, outra fronteira tripla. A
Bulgo-Greco-Turco Européia. Não esquecendo que, onde passa o Rio
Maritsa, há a ruptura das periferias helênicas da Macedônia Central.
Se houvesse nascido aquí nestas terras, em 350 A/C, seria o que sou hoje
porém, não cidadão Albanês. Teria nascido na Ilíria e seria chamado do
que quer que eles se chamassem na época. Seria também um Celta
provavelmente. Mercenário, guerreiro, herói, cavaleiro, assassino,
traidor, libertador. Escolha o título que quiser. Nunca saberão de
verdade quem eu sou, muito menos o que me tornei. Mas não foi sempre
assim. Nunca é. Nos anos 60 eu tinha quinze anos. Era bondoso, gentil,
solidário e leal. Quase não consigo acreditar.
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Na calada da noite, invadiram nossas terras. Entraram na casa da minha
família comigo, pai, mãe, meus dois irmãos e irmãs dentro. Houve luta.
Mas não logo de início. Eram Chineses. Seis homens armados de fuzis e
metralhadoras, usando coletes bulet proof. Em suas cinturas, mais armas.
Estranhas. Altos, grandes e fortes, aparentavam terem vivido vidas
longas e violentas. O mais velho deles, liderava Han, Zhang, Zhongli,
Cao e He. Se chamava Shaohao, o abutre. Eles tinham vindo de longe.
Vinham de longe, cobrar uma antiga dívida contraída por meu genitor que,
com o passar dos anos, convenientemente acabou esquecendo de nos
contar. O preço era um de seus três filhos.
Meu pai sentou-se a mesa com Shaohao. Um de frente para o outro.
Esperaram em silêncio, enquanto nossa mãe preparava Chá Branco. Zhongli a
vigiava. Eu e meus irmãos, estávamos contra a parede da sala. Han
revistava nossas roupas. Zhang despia os homens. Cao e He sem nenhum
vestígio de lascívia, mandaram as meninas fazerem o mesmo. E assim
ficamos nós cinco. Nus e abraçados formando um bolinho, com nossas irmãs
no meio. Cinco jovens, cercados por quatro chineses mal encarados, que
aparentavam pertencer ao exército vermelho. Aliado da Albânia na época.
O chá ficou pronto. Minha mãe serviu os dois. Enquanto ela segurava o
pires da xícara de chá, notei que ela não tremia. Aparentava não ter
medo nenhum minha mãe. Era uma mulher alta, forte como um touro, roliça e
corada. Seu rosto era uma máscara de neutralidade que não transmitia
sentimentos. Papai também. Meu velho, era um homem atarracado de pele
alva, mãos enormes com braços e pernas grossas; como troncos de árvores.
Fiquei morrendo de medo dos dois. Era como se visse pela primeira vez,
como eram de verdade. Sem máscaras. Ao lado daqueles homens monstruosos,
estavam entre seus pares. Iguais.
Meus pais foram revolucionários. Os chineses os recrutaram quando muito
jovens. Passaram um tempo na China. Não sei o que aconteceu por lá.
Nunca tocaram no assunto. Fizeram o que tinham de fazer e
aposentaram-se. Foram deixados em paz. Estabeleceram-se nestas terras
por serem daqui mesmo. Começaram a trabalhar duro nos campos e foi aí,
que começamos a nascer deles um por um. Um atrás do outro sem parar, até
sermos cinco irmãos. Nunca fomos a escola. Nossos pais nos ensinaram
tudo. Sabíamos ler e escrever bem. Em várias línguas. Sabíamos
matemática, física e filosofia. Mecânica. Sabíamos montar cavalos,
adestramento e manejar facões, forcados, marretas, lanças e tridentes;
que não são forcados e sim, lanças de três pontas destinadas a combates,
e arremesso. Sabíamos defesa pessoal e criar objetos de aço, usando
fôrmas de argila. Entretanto, saber era inútil frente a estas pessoas.
“Nenhum de nós cinco consegue.” – Pensei eu naquela hora – “Talvez a mãe
derrube um. O pai com certeza abate dois. Depois morremos todos.”
– Não façam nada! – Meu irmão mais velho disse baixinho, entre dentes.
Han, Zhang, Zhongli, Cao e He sorriram.
Shaohao, o abutre, sorveu um gole de chá. A sombra de um sorriso, pousou
em seus lábios finos, semi-cobertos por um longo bigode branco e fino;
que lhe chegava até a altura do peito. Foi então que meu pai falou:
– O tempo não tem mesmo efeito em ti mestre. Que nome usa atualmente? Algum dia saberei seu verdadeiro nome?
– Somos apenas sombras fugazes, passando ligeiras sobre o vale.
– Nós cumprimos nossa parte. Existem tantos outros. Deixe-nos em paz mestre.
Shaohao guardou siléncio por um instante.
– Sempre questionador. Sempre seguindo sua verdade interior, em
detrimento da verdade maior. Caso queira saber nossos nomes atuais,
pergunte a seu filho. Ele sabe.
– Qual deles?
– Você sabe. Sabe desde antes dele nascer. Você não cumpriu totalmente
com sua parte do trato. Transmutações foram realizadas, acordos foram
feitos e, muitas vidas foram gastas; para que pudéssemos ligar nossos
caminhos novamente. Só porque você não cumpriu seu juramento. Era só o
ter entregue seis meses após o nascimento no Monastério. Uma viagem de
quinze dias, no mundo moderno. Mas não, vocês não fizeram isto. Então,
nós tivemos que atravessar o portal. Três imortais foram apagados da
vida temporariamente, por causa disto. Dez gerações. Dez.
Meu pai tomou um susto. Não agüentou sustentar o olhar de Shaohao. Então disse:
– Posso escolher o lugar do julgamento?
Shaohao o olhou com desdém.
– Voltaste rapidamente a pensar como um ocidental não é? Tu sabes que
escolheste o lugar ao colocar os pés nesta terra impura, no primeiro dia após seu retorno. Terra de ninguém. Onde legiões e generais são
tratados como escória e enviados ao inferno sem direito de defesa.
Escolheste bem o terreno, meu ingrato discípulo.
– Eles também estão inscritos no livro da vida e do destino. Eu apenas queria que pudessem conhecer outros mundos antes de...
Minha mãe, que estava atrás de papai colocou a mão em seu ombro, e ele se calou.
Shaohao ao terminar o chá levantou-se, nos cumprimentou e foi lá para fora. O último a sair foi Han que disse:
– Vocês tem hora e meia para chegarem até lá. Estaremos esperando.
Subiram em um monstruoso caminhão do exército vermelho. Partiram nos
deixando escuros, em siléncio. Gargantas secas. Alma embotada.
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A última coisa que papai nos disse, foi um ensinamento. Minha mãe olhava
firme para nós, deixando claro que papai falava pelos dois. Nunca
esquecerei a força daquele olhar. Digno, forte, inteligente,
sobre-humano e furioso.
– Todos os valores ocidentais, suas leis, planos, metas, livros. Todo
pensamento é apenas uma abstração, para que o corpo suporte a pressão
dos mundos. Os orientais, apesar de sua arrogância, também vão pelo
caminho errado pois, seu caminho é invertido. Não os leva até o próximo
nível; apenas os faz retornar a pureza inicial. A questão não é
sobreviver. Já estamos todos mortos. O negócio é o seguinte; aprendam o
máximo que puderem hoje. Renasçam disto se puderem. Nunca mais terão
esta oportunidade. Vistam-se com roupas confortáveis. Calcem sapatos
resistentes. Peguem as armas de sua preferência. Apenas uma para cada
um. Lhes daremos de comer e beber. Depois, nos esperem na frente a
Kombi.
Éramos cinco irmãos. O mais velho tinha dezessete, o segundo dezesseis, o
terceiro que era eu, quinze. Minhas duas irmãs, tinham quatorze e treze
anos. Obedecemos a nosso pai. Vestimo-nos com algo semelhante a
moletons. Alguns calçaram sandálias de corda, que permitiam movimentos
leves e ligeiros. Outros, sandálias no estilo de legionários romanos. De
couro, com solado de couro, no qual eram fixadas ferraduras. Do
calcanhar ao dedão do pé. Calcei sandálias legionárias. Usando estas
sandálias, os meus antepassados Romanos, marcharam por toda a Albânia;
esmagando sob seus pés os inimigos caídos. Uma pisada dela já era um
martírio. Imagine uma legião sob o comando de cinco Centuriões,
perfazendo o total de quinhentos homens marchando com elas; sobre
guerreiros caídos ainda vivos, com ferimentos nas pernas, ventre,
pulmões, tendões; ... etc. Todos vestimos protetores de canela e
joelhos, as grevas. Depois fomos comer. Comemos bem. Não demais. Comemos
mel, mingau de aveia, trigo, nata, creme, ovos, pão de centeio e nacos
de porco. Bebemos água fresca.
Papai nos aqueceu. Corremos por dez minutos ao redor da casa. Mamãe nos
alongou nos estábulos. Os alongamentos dela, que no início, eram seções
de dor excruciante; com o passar do tempo, transformaram-se em prazer, e
depois um vício. Necessidade. Até, que tornou-se parte cotidiana de
nossas vidas. Como respirar ou ir ao banheiro.
Após estas atividades, nos abraçamos uma última vez.
Meu bravo irmão mais velho, e minha linda irmã mais nova, encilharam os
dois melhores cavalos, equipando-os com tudo que fosse necessário para
um viagem de quinze dias. Depois partiram rumo ignorado. Meu irmão mais
velho, parecia saber onde ir. Tudo fazia parte de um plano elaborado por
meus pais. Nunca, nenhum de nós conheceu sua totalidade creio eu.
Melhor assim.
Eu enxergava o mundo com uma crueza e seriedade intensa. Um mundo duro e
frio. Sem cores berrantes. Todas as sensações corporais equilibradas.
Nenhuma sobrepondo-se a outra. Sem saudade, alegria ou medo. Aquela foi a
última vez que estivemos juntos. Sabíamos claramente. Esta era nossa
força. Verdade sem véu. Sem céu ou inferno. Apenas a luta. A guerra.
Inteligência, velocidade, avanços, recuos, força, violência, tática e
técnica. Mas havia ar fresco. O cheiro orvalhado madeira agreste natural
na noite. Morcegos. Aves migrando pelo céu noturno. Lua gigante. Chuva a
caminho no horizonte. O dia ia amanhecer em breve. Eles vieram na
calada da noite. Dedos de neblina acariciando montes. Entramos na Kombi e
partimos. Rumo a colina.
Cruzamos um fundo de vale coberto de cerração. Nosso carro atravessou um
riacho pedregoso, de água cristalina. Havia uma vaca morta próximo a
água. Presa por arames farpados ao redor do pescoço havia enforcado-se.
De seu corpo inchado escorria secreção. Isto, longe de contaminar a
água, fortaleceria os peixes. Cruzamos na reta com trabalhadores rurais
calados e sombrios. Suas bestas cansadas arrastavam carroças cheias de
sementes, apetrechos, água e carne salgada. Uma raposa vermelha
atravessou a estrada. Corvos nos acompanharam em revoada. Faltava pouco,
muito pouco para o dia amanhecer.
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Um quilômetro a frente avistamos o morrinho. Seguíamos em silêncio.
Éramos cinco. Pai, mãe, um irmão mais velho, uma irmã mais nova e eu. A
medida que nos aproximávamos, vimos lá no alto sobre ela, aves
carniceiras pairando em círculos. Centenas. Naquele ponto, a inversão
térmica da noite dando lugar ao dia; gerava ventos que ajudavam estas
criaturas a elevarem-se a alturas impressionantes. Sabíamos, que este
não era o motivo delas estarem lá naquele dia. O motivo era outro. Acho
que você entende.
Falando sobre você; gostaria de saber, se já começaste a entender o que significa algoz?
Uma das características mais marcantes de um bom verdugo, é fazer você
sentir-se culpado. Culpado por tudo. Pela morte de amigos, irmãos, pais.
O desalmado perfeito, tem o dom de lhe fazer crer, que você merece ser
punido. Enquanto houver vida, ele lhe repetirá a promessa enganosa
dividida em duas partes. A mesma promessa, travestida com roupas
diferentes desde o início dos tempos. A possibilidade de livrar-se da
dor. Que seria a bênção da morte. E uma promessa de vida se, você
arrepender-se e entregar-lhe tudo. Quando digo tudo é tudo. O algoz,
mantém essa chama acessa, brilhando forte; até o último instante. Até
não sobrar nada de você. Porque você deu tudo. Até o sujeito tornar-se
irreconhecível para si próprio. Escuro de tão aviltado. Normalmente
nesta hora; você já não é mais um ser humano. E eles lhe matam
friamente, com distanciamento; como se mata um cão. Menos que um cão.
Caso você esteja no nível canino, e eles simpatizarem muito com você;
lhe deixam viver. Aí, podes voltar a desfrutar das delícias da vida. Mas
vivendo como um cão. Fazendo coisas que cachorros fazem. Vida de bicho
animal. Que tal? Não? Não concorda?
Então lutemos. Lutemos até a morte. Sabemos que vamos perder, todavia
isto é o de menos. Lutemos com ferocidade pois, uma morte em combate é
rápida como o raio, e leve como a pluma. E humana. E digna. E piedosa. E blá-blá-blá. E coisa e tal.
Naquela época, eu não sabia que estava errado; mas esta era minha única
opção. Não ouso me arrepender das escolhas que faço. E você, se for
esperto, também não. Também não. Também não. É possível, construir um
lugar em sua mente onde ninguém possa lhe tocar. Não é todo mundo que
consegue. Poucos. Muito poucos são, hábeis suficiente para isto. E é
mais fácil entrar do que sair. Mais fácil entrar do que sair.
O sol raiou um novo dia por de trás da colina. Um nascer perfeito por um
instante. Rubro, ouro, púrpura e vermelho sangue. Cordas de neblina
serpenteavam pela corcunda pedregosa. Pássaros negros grasnavam em
contraste com aquele amanhecer. Shaohao e os seus, nos esperavam lá em
cima, na pedra mais alta da elevação. Descemos do carro. Estávamos em
casa. Treinávamos naquele monte, desde que éramos pequenos. Conhecíamos
aquele lugar como a palma de nossas mãos. O impressionante, é que os
Chineses também. De alguma forma que não sei; também. Senti isto.
Certeza.
O esplendor foi-se embora. O céu fechou. Uma garoa fina aconteceu. O
vento norte chegou. Não sentimos. Paramos a Kombi aos pés da colina.
Subimos a pé. Esticávamos nossos músculos. Aquecíamos nossos corpos
usando movimento. Concentrávamo-nos.
Havia chegado a hora de morrer. Éramos tão jovens. Até meus pais eram
jovens. Foi tudo há muito tempo atrás. O que meus pais sabiam naquele
tempo, só começo a compreender agora. Sou um velho. Um velho com suas
memórias. Um velho com histórias.
Se não é do seu interesse; paro de contar agora. Deixo este conto para
os outros. Outros que possam querer o que tenho para contar. Em outros
tempos. Outras eras. Quem vai saber? Eu não sei. Vai saber você?
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Alcançamos o alto da colina. Pai e mãe iam a frente. Depois meu irmão e
eu. Mina irmã seguia calmamente atrás de mim. Não estávamos cansados.
Aquela subida não era nada. Um círculo de combate com quinze metros de
diâmetro fora estabelecido. O terreno acidentado da corcunda, tinha
duzentos por cento e dez metros. Medidas exatas.
Meu pai e Shaohao, foram para um canto negociar regras de combate. Um
truque cruel, que deu a meu pai, três vantagens compostas. Generosas
vantagens. Não para mim. Nunca. Mas ele sabia o que fazia.
Fechei os olhos e me concentrei. Ouvi o dialogo pela cabeça de Shaohao. Foi assim:
– Você agiu errado conosco. Será punido. Nos deu trabalho. – Começou Shaohao.
– Eu e minha mulher cumprimos com nossa missão. Desempenhamos nossos
papéis a perfeição. A organização, estaria acabada se não tivéssemos
sido bem sucedidos. Vocês nos treinaram bem. – Ripostou meu pai.
– Não bem o suficiente, para que aprendessem que ninguém nos escapa. Ainda mais pais de predestinados.
– Quem disse, que pretendíamos escapar?
– Quando eu te elevei ao éter e além; o que foi que você viu e não me
contou? O que está trancado em suas mentes que não revelam?
– Estabeleçamos um acordo, que seja satisfatório para ambos, e este conhecimento será seu.
– Não volto para China sem sua alma. – Fala Shaohao.
– Que minha alma seja sua, depois do combate. Mas desejo quatro vantagens.
– Não volto para China sem a alma da tua mulher.
– Que a alma dela seja sua, depois do combate. Desejo três vantagens.
– Não volto para China sem o garoto. Ele é meu.
– Que seja assim, após o combate. Exijo três vantagens.
– E quais seriam elas?
– Os dois que partiram a cavalo são irrelevantes. Deixa-os em paz para sempre. – Pede meu pai.
– Certo. Estas são duas vantagens.
– Uma. Uma vantagem. Eles são irrelevantes e fracos. – Afirma meu pai.
– Duas vantagens.
– Mestre, se continuares agindo assim; sairás das minhas terras de mãos
vazias. Sem meu segredo, sem o garoto e sem almas. Eu paro meu coração
agora. Os outros fazem o mesmo. Iremos para um nível diferente do seu.
Ficará sem nada. Escaparemos por entre seus dedos. Só não faço isto
agora, por adorar a vida.
– Certo. Uma vantagem. Quais seriam as outras duas?
– Quem cair em combate; deve ficar no chão até o encerramento do último
combate. Devendo lutar como homens. Nada mais nada menos. Esta é a
primeira vantagem dividida em duas fases.
– De acordo. A segunda vantagem por favor?
– A menina mais nova, parte agora une-se a seus irmãos a cavalo. Vocês a deixam em paz para sempre.
– Aí já é demais! – Sahohao pragueja em Chinês irritado. Vou correr o
risco então. Levarei quantas almas puder. E os dois que escaparam, serão
meus cães por toda a vida miserável deles.
– Reformulo a segunda vantagem mestre.
– Diga.
– A mais nova combate ao lado do irmão mais velho. Caso sobreviva; ela
fica livre. Se não ela é tua. Caso o mais velho sobreviva ou não ele é
teu. E fique com o médium contudo...
– O que?
– Após combate. Deixe-o lutar por sua liberdade ao menos.
Shaohao dá uma gargalhada. E diz:
– Lhe faço uma contraproposta geral. O garoto luta comigo agora, e se me
deitar no chão; todos podem ir, inclusive ele. Que sejam felizes para
sempre com a minha bênção. Mas se o garoto perder todos virão comigo.
Selaremos laços eternos.
É a vez de meu pai gargalhar.
– Fico com a proposta anterior. Recuso sua contraproposta. – Afirma papai.
– O garoto deve decidir. – Riposta Shaohao.
Meu pai se vira para mim e me olha fixamente a distância.
– Meu pai é senhor do meu destino. ¬– Respondi eu. Mas o que eu queria
mesmo, era salvar todos. Nem que fosse a custo de minha vida. Shaohao
pareceu ficar satisfeito com isto.
– Parece que você conseguiu suas três vantagens. Seu poder de negociação
desenvolveu-se exponencialmente. Vantagem primeira liberdade para o
primogênito e a caçula e luta justa. Segunda vantagem possibilidade de
liberdade plena para a segunda filha a custo do segundo mais velho.
Terceira vantagem, direito de defesa para o predestinado.
– O que são vocês? – Pergunta papai – Usam nomes de deuses; entretanto,
não o são. Vestem uniformes vermelhos todavia não dividem a mesma
ideologia. Espalham-se pelo mundo inteiro mas não são vistos. O que são
vocês?
– Discípulo. Tens olhos argutos. Não adianta forçares mais tua
capacidade de compreensão. Chegaste ao limite do humanamente possível.
Há muito tempo os Deuses partiram deste mundo. O que sobrou foram
sombras, reflexos, espelhos. Seu filho não é um grande médium; é apenas
uma pequena ponte que vai nos servir enquanto agüentar.
Encerraram as negociações. Aí veio o combate. Chegou hora das dores. Tempo de matar.
Papai passou por nós, olhando em nossos olhos. Estávamos alinhados lado a
lado, segurando nossas armas. Cabeça erguidas para podermos ver melhor.
6
Meu velho entrou no círculo, usando apenas uma faca Katar de duas
lâminas uma ao lado da outra. O Katar é um arma em forma de H onde uma
das extremidades termina em lâmina e a outra em duas hastes. Que podem
ser invertidas para socar. Depende do design da extremidade do H. Era um
Katar simples e forte de sessenta centímetros. Muito afiado. Dizia que
havia matado tigres com ele quando esteve na Ásia. Era verdade.
Han, Zhang, Zhongli, Cao e He sorriram novamente. Shaohao olhou para
Zhongli e deu um grito marcial. O adversário de meu pai havia sido
escolhido. Uma única espada curva, de monge Shaolim, foi a arma
escolhida por ele.
Treze metros os separavam. O círculo de combate não era limpo. Haviam
pedras pelo caminho que podiam ser usadas como armas, obstáculos,
patamares. Artifícios, distrações.
Correram um em direção ao outro. O chinês venceu rapidamente sua parte
da distância colocando primeiro o pé em uma pedra mais elevada. Quando
ia dar mais um passo para outra pedra. Meu pai invertendo o Katar livrou
seus dedos que junto com a outra mão agarraram o pé direito do chinês
rodando-o no ar. Atirando Zhongli ao solo duro, fazendo com que a cabeça
dele batesse contra uma pedra uns oitenta quilos que explodiu com o
impacto. Nunca tinha visto alguém ser tão rápido assim. Nem investida
mais brutal. Tampouco a exemplar recuperação chinesa. O oriental rolou
pelo solo pedregoso como uma bola pondo-se de pé num salto bem longe de
papai. A lateral direita da cabeça ferida. Olho vazado. O china sorriu
focado e cheio de maldade no olhar adulterado. Meu pai aproximou-se
novamente correndo forte. Socou com o Kata. Zhongli defendeu-se
facilmente com a meia lua da escapa curva, e respondeu com um golpe
frontal que acabaria na coxa direita do pai se ele não tivesse invadido
a guarda do chinês. Papai rodopiou para longe de seu alcance, recebendo
apenas uma pernada nas costas que o fez voar longe. Durante esta
projeção o china arremessou a espada curva que errou a cabeça do meu
velho por um milésimo de centímetro, fixando-se numa parede rochosa onde
meu Papi bateu e grudou como uma estrela marinha em um vidro de
aquário. Mamãe sorriu. Meu pai era um palhaço. Aquilo estava irritando o
chinês com certeza. Girando para o lado esquerdo papai firmou os pés
no chão enquanto Zhongli já estava lá retirando sua espada curva cravada
do paredão, e atacava novamente. Meu velho baixinho, desviava os golpes
com a lateral do Katar e respondia girando em contra-ataques velozes
demais para que meus olhos acompanhassem todos. Uma vez o gancho da
espada curva fisgou a linha metálica horizontal do Katar. Meu pai com
braço forte puxou Zhongli a seu encontro desferindo um potente chute
lateral na altura do umbigo do china. Este choque fez o Chinaman perder o
fôlego e arregalar os olhos de espanto, desencaixando as armas;
arremessando-o longe. Mais uma vez o chinês usou técnica de rolamento.
Meu pai foi logo atrás; buscando-o com a ponta de sua Katar longa dupla.
Katar já perfurava armaduras milênios antes de nascermos. Para ela,
atravessar coletes a prova de bala; era uma brincadeira. Quando Zhongli
conseguiu levantar-se tinha furos nas pernas, nas costas e na nuca. Mas
mesmo assim levantou-se. Furioso, o chinês arrancou do chão uma pedra de
cem quilos e atirou-a na direção do velho, que saltou de lado e correu
de encontro ao asiático. Chinaman parecia abatido, bêbado. Meu pai
sempre foi um homem confiante. Acreditou que aquela era a hora de deitar
Zhongli por terra de uma vez por todas. E frente ao ataque certeiro de
papai, o Chinaman; num movimento de serpente para trás desviou-se do
golpe fatal, enfiando a ponta da espada curva na altura dos rins do meu
velho que respondeu. Cravou a Katar no olho bom dele, num movimento
pouco ortodoxo de cima para baixo, onde a palma de suas mãos abertas
apenas empurraram a lâmina para baixo em direção do olho, palato
superior fixo, palato inferior móvel. A ponta do Katar apareceu próximo
ao queixo na lateral do rosto do Chinaman. Que recusava-se a cair.
Caolho acertou o joelho de papai com a espada curva, mas papai usava
grevas metálicas nos joelhos e canela. O velho afastou-se cinquenta
centímetros e soltou um giro de pernas. A sola de sua sandália romana
explodiu contra o rosto castigado de Zhongli, que rachou esmagado sob a
força potente do impacto. Chinaman foi ao chão. Não mais levantou-se.
Meus irmãos gritaram:
- Ele venceu! Papai venceu! Estamos salvos!
Eu calei. Tinha entendido o acordo. Meu pai não pensou nele, nem por um segundo. Ele não sairia vivo daquele círculo.
Cao saltou dentro do anel de luta. Foi direto ao rim ferido do velho
que, recebeu uma bastonada de matar no local. Demonstrou não sentir dor.
Na verdade, ele apenas desligou estas sensações. Era um homem de
disciplina exemplar, que sabia controlar sua mente como ninguém. Cao
lutava com bastão de carvalho com luvas de ferro. Meu pai defendia-se
com as grevas e Katar. Seus braços sofriam com o impacto do bastão. Cao
veio girando-o a grande velocidade. Sua arma foi travada pelo Katar que
soube bem o tempo de giro do bastão. O velho, entrou na guarda de Cao,
enfiando a lâmina dupla fundo em seus pulmões de baixo para cima. A
ponta entrando na altura do estômago. Contudo, Cao não caiu. Moveu-se
para trás e desceu o bastão com força na cabeça do velho. O impacto da
pancada o fez saltar para cima de um jeito ridículo, jogar a cabeça para
trás e cair de costas no chão. Cao pulou sobre ele, como uma aranha.
Pernas abertas, bastão no meio, seguro por ambas as mãos. Ele queria
cravar o velho no chão. E cravou. Fundo. Não sei como aquele bastão,
conseguiu penetrar um metro e cinqüenta centímetros dentro daquele chão
duro. Mas, este excesso teve um preço para Cao. Quando chegou perto o
suficiente, meu velho sem ver muito bem, fincou a parte invertida do
Katar em forma de dois punhos no ventre cortado de Cao. Quando meu pai
retirou sua mão lá de dentro, ela saiu com os pulmões do Chinaman.
Impressionante. Cao teria gritado indignado, se ainda tivesse seu fole.
Não teve outra escolha, caiu de cara na lama.
Mamãe entrou na roda. Fechou os olhos do companheiro protegendo-os do
sereno. Passou de leve a mão no rosto do marido pela última vez.
Dirigiu-se ao centro do círculo. Desenhou no ar alguns movimentos de
força. De algum lugar escondido na cintura, sua mão esquerda produziu
uma clava de Jade. Com quarenta e cinco centímetros de comprimento,
feita de uma pedra de jade verde especial sem veios; formava uma
estrutura coesa. Pesava impressionantes cinco quilos e quatrocentas
gramas. Um fuzil carregado, não pesa tudo isto. Testada muitas vezes em
combate, provou-se resistente a todo tipo de enfrentamento. Ela usava
grevas de aço do calcanhar, até a coxa. Grevas articuladas nos braços e
ante-braços idem. Uma extensão, unia as grevas superiores ao ombro;
formando uma proteção em torno da nuca, por onde o cabelo louro
espalhava-se; ondulando selvagem, sujeito ao forte sopro do vento norte.
Garoa ia e vinha intermitente. Farejei leve aroma de terra molhada,
sangue, lama e vísceras. Nuvens baixas, contorciam-se sobre nossas
cabeças por toda a extensão do platô; formando belos e estranhos
desenhos circulares no ar. Minha mente interpretava tais projeções do
jeito que queria. Hora carrancas, outra cavalos, por vezes dragões e
palavras arcanas; assim como figuras geométricas. Para mim, eram de
origem extraterrena.
Han, Zhang e He; não sorriam mais. O abutre vomitou novo comando marcial
em Mandarim, depois em Mongol. Han apresentou-se dando passo a frente.
Olhou ao redor. Deu um profundo suspiro. Girou os ombros largos. Colou a
testa nos joelhos. Para não sujar as roupas, tocou o chão com a ponta
dos dois dedos indicadores. Seu corpo ficou suspenso no ar equilibrado
naqueles dois dedos. Han afastou as pernas com um movimento lateral.
Elas abriram-se cento e oitenta graus; até ficarem paralelas a linha do
horizonte cinzento. Fazia muito tempo, que ele não usava aquele corpo
daquela forma. Entendi isto. Depois, com um movimento anti-natural muito
desarticulado que fez seu tórax parecer estender-se para o alto
enrolando a coluna para frente; suas pernas ultrapassaram a linha dos
ombros e com a ponta dos pés avançando a diante; tocou o chão com eles.
Concluiu a contorção; e logo estava em posição ereta novamente. Das
costas, fez surgir um sabre de tai-chi chinês. Também mão esquerda.
Han carregou sobre ela como um búfalo e desceu a porrada. Ela por sua
vez; foi hábil em movimentos de esquiva. Tórax para frente, para trás,
saltos. Suas grevas de braços e pernas trabalhavam eficientemente
travando o sabre do terceiro Chinaman. A balança parecia pender para o
lado de Han que gritou para ela:
- Vaca loura vai morrer. Vai morrer logo-logo. Bem devagar.
Ela arregalou os olhos de surpresa. Não estava acostumada a ser tratada
assim de forma alguma. Num amplo movimento giratório de esquiva, como um
pião; afastou-se o suficiente de Han para correr dele. Correu uns três
metros ao longo da parede de uma pedra comprida. Han a caçou. Parecia um
lobo atrás da presa. Mamãe, encaixou o pé esquerdo em uma saliência
enquanto corria saltando alto. Han a seguiu erguendo a espada para trás.
Um erro. A vaca loira, girou no ar ficando de frente para seu oponente.
Enquanto suas pernas esticadas iam para cima, a parte superior do corpo
dela ia para baixo em movimento contrario. Um golpe de mestre
inesquecível. O ponto de impacto, deste movimento articulado com a peça
de jade, foi na cabeça dele. A providência, foi estar usando um elmo
leve. O potente porrete resvalou pela superfície lisa do elmo e foi
afundar-se entre o ombro e pescoço de Han. A arma pesada, afundou na
carne do Chinaman; esmigalhando clavícula e costelas superiores da caixa
torácica comprometendo o funcionamento pulmonar. Han foi lançado de
modo violentíssimo contra o solo. O som foi inesquecível.
“Sklink! Craacrack! Splashbackcrack!”
Vaca Gorda, pousou no chão com suavidade de frente para a cabeça do
adversário caído a seus pés e se Han fosse um homem comum teria fica lá
prostrado no chão. Contorcer-se-ia, molemente; tomado por alucinante dor
pungente lancinante sem conseguir tomar ar. Infelizmente para vaca
gorda; Han era fora do comum. Anulando completamente o sofrimento em seu
cérebro; adaptou o corpo lesionado numa nova modalidade de luta
deformada. Movimentava-se de forma anômala, monstruosa, antinatural.
Fascinante. Seus golpes em nada perderam a potência graças a seu poder
de adaptação e o combate prosseguiu. Han surpreendeu mamãe, com uma nova
e espantosa técnica de defesa usando as pernas. Saltava lateralmente de
cabeça no chão, usando o lado esmagado pescoço-clavícula como base de
onde lançava potentes contra golpes na região da oitava e nona costelas
onde fica o baço e próximo a lombar 1 e 2 castigando minha amada.
A hora de minha mãe chegou desapercebida para ela; quando Han sofreu um
afundamento de ombro para dentro do tórax em um de seus saltos. Segurava
o sabre na mão direita que sabia menos que a esquerda inutilizada por
culpa do golpe que recebera.
Nesta queda o Chinaman imperceptivelmente jogou o sabre para a mão
esquerda. Vaca Gorda saltou sobre Han para desferir o golpe fatal. O
sabre, como se tivesse vida própria; foi junto com a mão esquerda, o
ombro afundado desafundou-se por si só, graças a uma força muscular que
eu desconhecia; trabalhando como se o braço fosse um chicote flácido, um
dedo abaixo do umbigo de minha mãe. Região onde passa grande quantidade
de sangue. Corte de sua arma estava virado para cima numa pegada
invertida. Esventrou-a imediatamente. Ela por sua vez; esmigalhou a
cabeça de Han que mergulhou para dentro de seu peito com capacete e
tudo. Lembrou-me um caranguejo com uma garra maior que a outra.
Agora, haviam cinco corpos caídos pelo chão. Ninguém se levantou. Depois de golpes fatais como estes nada levanta mais.
Meu irmão mais velho segundo e, minha segunda irmã mais nova entraram no ring.
7
A menina, usava grevas protetoras nas pernas e braços, elmo leve
brilhante de bronze polido. Bem armada ela estava. Nunchaku médio de
ferro e uma besta de mão. Meu irmão, usava sua arma preferida. Tridente,
escudo e uma faca de arremesso.
Minha irmã era de porte pequeno, leve, veloz e resistente. Uma menina
forte, que calçava sandálias leves de corda. Meu irmão era mais alto do
que eu, mais forte que eu. Puro instinto. Não era esguio e flexível como
eu. Era denso como papai, mas como era jovem, era tão forte quanto; com
a vantagem de ser mais leve. consequentemente, por causa do treino; era
veloz como uma serpente. Mesmo que seu corpo não tendesse a isto. Um
adversário admirável. Admirável.
“Será o primeiro a morrer.” – Pensei desgostoso.
A garota, correu como um raio; buscando o ponto de partida mais alto. De
lá, poderia dominar com o olhar; os primeiros movimentos do combate.
Esperta. Meu mano, correu para uma elevação menos elevada próxima a
irmã. A menina o defenderia e para chegarem a ela; teriam que passar por
ele. Agachou-se sobre da pedra como um macaco. Abriu os braços,
segurando o tridente com um e o escudo fixo no antebraço do outro.
Sorriu um sorriso feroz; com a faca de arremesso entre os dentes. Ele
realmente era muito perigoso. Mesmo.
Na face de Zhang e He, não havia mais nem sombra de sorriso. Eles
achavam, que este seria apenas mais um julgamento fácil. Onde a decisão
sempre pende para o mais forte. Mas no meu caso e da minha família, os
mais fracos se prepararam. Os mais fracos tornaram-se fortes. Dispostos a
sacrificarem tudo em nome não de uma vitória, e sim da verdadeira
constatação que, caso o acordo estabelecido não fosse respeitado.
Certamente haveria represálias. Custo alto. De fato pois, meus dois
irmãos que fugiram a cavalo; eram os melhores de nós. Melhores
lutadores. Melhores estrategistas. Melhores em tudo. Tudo. E agora, o
inimigo estava enfraquecido. Bem enfraquecido. Olhei de relance, o
bestial caminhão de carga chinês. Era uma máquina especial sem dúvida,
pois chegou até o alto da corcunda. Por um instante, perguntei-me qual
seria sua carga e se quando me levassem; pois eles iam certamente, se
haveriam armadilhas ao longo da estrada.
Chuva de Shuriken sobre meus irmãos, abriu a peleja deles contra Zhang e
He. Dois velhos lobos guerreiros experimentados, contra dois jovens que
nunca haviam matado nada, que não pudessem comer. Verdade.
Defenderam-se magnificamente bem. É preciso muita fibra. Não se pode
fechar os olhos. Não se pode perder a concentração ou foco. Um milésimo
de segundo de vacilo, te coloca fora do fluxo e perde-se o ritmo. Você
não deve sair de sincronia nem mesmo com Shuriken cravado numa perna,
braço ou olho. Estas estrelas da morte, podem ser lançadas em unidades,
duplas e grupo de três. Três estrelas é o máximo simultaneamente. Em
cada mão. Três estrelas em cada mão. Dois lançadores. Quatro braços,
quatro mãos. Faça as contas. Em um minuto, uma única mão de um guerreiro
treinado lança três a cada sete ou oito segundos. Faça as contas. Meus
irmãos não expuseram-se a chuva Shuriken completa. Apenas uns quarenta
segundos de arremessos. Suas proteções metálicas repelindo com precisão
estrelas da morte. Desviando-se velozes de pontas afiadas que por
milímetros erravam o alvo uma apos a outra. Movimentos defensivos
magistralmente coordenados. Protegeram-se atrás das pedras. Recolheram
as estrelas que encontraram. Guardaram com eles. Não foram feridos.
Habilidade não é tudo. Até hoje, quando vejo alguém superar as leis da
probabilidade encarando de frente um desafio; vem duas ou três palavras
em minha mente. Não as digo em voz alta. Determinação, coragem e sorte.
Muita, muita sorte. Não tem jeito. É assim. Quem não corre riscos, não
paga para ver. Fecha os olhos; falha com a vida. É atingido por forças
invisíveis. Morre em vão. Não é isto que se espera de nós.
Meus irmãos eram estrategistas. Meu Brow, quanto atirou-se para trás da
pedra; caiu simulando ter sido ferido. Soltou o ar dos pulmões e gemeu
baixinho. Isto foi tudo que seus adversários precisavam. Não foram em
sua direção. Contornaram a posição onde ele guardava a frente da minha
irmã. Iam ataca-la pelos flancos. Quando deram a volta na pedra ela não
estava lá. Encontraram meu irmão, que lhes devolveu alguns de seus
Shurikens. E quando ele recuou para sua posição anterior, a pedra menor;
Foram alvejados pela besta de mão, pela faca de arremesso e por mais
Shurikens. Aí, os garotos correram para o outro extremo do ring. Zhang e
He foram atrás deles. Pareciam porcos espinhos, mancando, gemendo e
grasnando; de tantas estrelas nos braços, pernas. Infelizmente, a maior
parte; parou nos coletes Bullet Proof. Ambos usavam espadas longas.
Belas e brilhantes damas Japonesas. Beijo doce arrepio que precede a
agonia da morte; elas tem para dar. Ah sim. Isto elas tem para dar.
8
Minha irmã colou-se as costas de meu irmão quando Zhang e He iniciaram
ataque frontal direto contra ele. Moviam-se como se fossem um. Colados.
Ele brandiu seu tridente a esquerda e a direita bloqueando golpes de
espada. Avançou sobre o guerreiro que estava mais próximo dando as
costas ao que estava um passo mais distante. Na fração de segundo que
levou este movimento onde era para meu irmão estar desguarnecido lá
estava minha irmã que acertou um tiro certeiro de besta de mão na
garganta de He. Assim que conquistou esta vantagem; descolou-se de meu
irmão e partiu para cima do guerreiro ferido com seus nunchaku de ferro.
Lindo ver ela dançar. Com seus passos leves, velocidade felina
esquivava-se de golpes horizontais e verticais efetuados pelo atacante
chinaman Zhang e audaz furava as guardas do inimigo demolindo-o mais
ainda com pancadas potentes de sua arma.
A resistência física dos adversários da minha família aproximavam-se do
sobre-humano. Zhang estava quase moído, quando conseguiu machucar de
verdade minha mana. Um inimigo resistente é um problema a parte. Pior
que inimigos habilidosos por vezes. Um guerreiro habilidoso pode ser
abatido por um golpe sutil se dermos sorte. Já um resistente não. O
chinaman deu um passo para trás. A ponta de sua lâmina na direção oposta
do abdômen de minha mana. Ela caiu dentro. O cabo da espada do china
atingiu o rosto dela partindo o nariz e afastou-se. Depois, em vez do
cabo, veio a lâmina querendo abrir a cabeça dela. Ela desviou-se. Acabou
sendo ferida profundamente no ombro. Se ela não fosse quem era; estaria
partida ao meio sobre as pedras da corcunda. Ninguém alí estava
brincando. Num último movimento desesperado ela sacou a besta de mão
presa nas costas. Olhou para meu irmão a tempo de vê-lo cravar seu
tridente no coração de He. Seu irmão estava morto. Matava seu inimigo
com a espada do mesmo atravessada no pescoço. Isto, em vez de
desestimula-la; pareceu redobrar suas forças. E assim, ela obteve êxito
derrubando Zhang com um tiro perfeito de besta de mão que entrou pelo
orifício nasal esquerdo do china e despontou no topo da cabeça com
pedaços de cérebro. Em silêncio, minha irmã partiu corcunda abaixo
levando nada a não ser si própria e um ferimento profundo. Havia
curativos na Kombi eu sabia. Ela tinha a chave.
Os combates terminaram. Shaohao desafiou-me. Eu lhe disse que aceitaria o
desafio. Mas não naquele dia. Reservei-me o direito de escolher data e
hora. Ele acatou mas, até que este dia chegasse; seria seu prisioneiro
na China; já que não me podia matar ou julgar. Respondi a ele:
– Isto, quando chegamos a ela. Até lá é um longo caminho. Por enquanto prefiro me imaginar como um convidado.
Shaohao gritou com seus mortos:
– O julgamento acabou! Levantem-se.
Os cadáveres de Han, Zhang, Zhongli, Cao e He começaram a estremecer.
Shaohao sorriu matreiro. Latiu:
– Vocês três também. Suas almas são minhas assim decidiu o combate.
Os cadáveres de meu pai, mãe e irmão; começaram a estremecer.
Fim
Como sempre, dedico a Lumyah e Raphael meus queridos.